sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Tempos dantescos



O Ministro das Finanças e o Primeiro-Ministro têm nos últimos dias vindo a público reafirmar que não vão aumentar os impostos até ao fim da legislatura e mostram-se confiantes na recuperação da economia portuguesa. É o papel deles. O problema é que por muito que jurem que não vão aumentar impostos não vai mesmo haver outra alternativa. Por muito que Sócrates confie no investimento público para salvar a economia portuguesa, Portugal atravessa um momento de tal maneira grave que é preciso que alguém lhe diga que se continuarmos assim caminhamos para o abismo- e ao contrário do que o Primeiro-Ministro diz a culpa não é da crise internacional. Basta olharmos para os números ultrajantes que reflectem aquilo que é a economia portuguesa.  a preços acumulados e correntes, os impostos nacionais engordaram 964% entre 1985 e 2008.  Isto tem sucedido por causa desse mito que existe em Portugal de que o Estado é o salvador da pátria e que sem Estado não há economia. E para alimentar o monstro do Estado a receita tem sido sempre a mesma: via impostos. Este peso brutal do Estado na economia só tem asfixiado Portugal e enquanto ninguém mexer nisto, quando a crise internacional passar Portugal cá continuará com os seus problemas estruturais de sempre (e por causa deles demorará mais tempo a recuperar): uma carga fiscal brutal, um peso do estado na economia brutal, uma máquina fiscal burocrata e complexa que não serve minimamente para atrair investimento directo estrangeiro de relevo e acima de tudo contas públicas completamente fora de controlo.


À conta do peso do estado, a dívida pública este ano está a bater recordes históricos e a culpa não é da crise internacional. A dívida pública já está nos 113% do PIB. Isto é dantesco e é surpreendente que não haja uma alma no parlamento português-dos partidos à esquerda à direita- que se mostre minimamente preocupado com o que aí vem. A dívida pública "oficial" representa já cerca de 81% do PIB e em 2010 deverá atingir os 90%. Somando-lhe o défice das empresas públicas e o dinheiro gasto com as Parcerias Público Privadas (as célebres PPP) a dívida pública já vai nos 113% do PIB. É bom lembrar que nestes últimos anos de Governo Sócrates temos assistido a um emagrecimento contabilístico do universo do Sector Público Administrativo (SPA), com a transformação de órgãos das administrações públicas em empresas ou entes públicos empresariais; e suborçamentação sistemática das indemnizações compensatórias pelo serviço público prestado pelas empresas públicas de transporte e das transferências para os hospitais, diminuindo artificialmente o défice público anual.  tudo em nome da crença de que o Estado é a solução para salvar a economia nacional. Para se ter uma ideia do que aí pode vir não é preciso viajar no tempo. Basta viajarmos até ao Dubai e vermos o que lá está a acontecer. Passo a citar o excelente editorial do Martim Avillez Figueiredo escreveu na semana passada: 


O que se passa no Dubai é um exemplo do que pode acontecer a uma economia como Portugal. Não é brincadeira. A dívida dos Emirados atingiu 103% da riqueza gerada e a economia, por lá, está sustentada nos serviços - valem 74% do PIB. É aí que estão os incríveis hotéis de sete estrelas, as ilhas em forma de palmeiras ou a pista de esqui em pleno deserto. É também por isso que o país declara agora precisar de mais tempo para pagar a sua dívida. Portugal, como se sabe, tem uma dívida próxima dos 90%. A economia, conhece-se também, vive dos serviços: valem 70% do PIB. Tudo o que produz é, em geral, para consumo interno - de quem vive ou de quem vem de fora. Não há - já se disse - os chamados bens transaccionáveis (esses produtos apetecíveis noutros mercados). A indústria, por isso memo, é residual.  Em Outubro de 2007 visitei demoradamente os Emirados. No Dubai, em Abu Dhabi, o jornalista Bruno Faria Lopes (que assina um trabalho nas páginas 18 a 21 desta edição) e eu conhecemos a realidade daquele incrível país. Ficámos deslumbrados, claro. Entrevistámos o homem que concebeu a media city, conhecemos os responsáveis pelas grandes construtoras e conversámos com um pequeno empresário de marcenaria que, de um dia para o outro, transformou a sua pequena oficina numa produtora de portas. Dizia ele, de sorriso rasgado: "Aqui encomendam-me 20 mil portas de madeira de cada vez." Era o melhor dos mundos. Uns meses antes, no dia 3 de Fevereiro de 2007, o xeque que agora surge em todas as imagens - o vice-presidente e primeiro-ministro dos Emirados Árabes Unidos, Mohammed bin Rashid Al Maktoum - tinha apresentado ao mundo o seu plano estratégico para o ano de 2015. Ele prometia mais porque acreditava na estratégia que tinha seguido. Dizia ele, de palavra segura: "O sector dos serviços foi a força impulsionadora do crescimento económico, com uma contribuição para o PIB de 74%, replicando as economias dos países desenvolvidos." Nessa tarde o Bruno e eu demorámo-nos na pista de esqui em pleno deserto. Comprando serviços ao xeque. Subitamente, o mundo mudou. O dinheiro deixou de entrar nos serviços do país e a empresa pública Dubai World (representa quase o país inteiro) explicou ontem que precisava de mais tempo para pagar as suas dívidas. Claro: se não vende serviços, não ganha dinheiro. Portugal tem uma economia semelhante, com a agravante de não ter pistas de esqui em pleno Rossio nem hotéis no Atlântico a lembrar palmeiras. Mas ninguém parece preocupado em alterar esta terrível dependência. O pânico do ministro das Finanças português - ao perceber que a oposição negara ao governo a possibilidade de receitas fiscais adicionais vindas do novo Código Contributivo - explica bem a incapacidade do país gerar dinheiro. E quando não há dinheiro... até o Dubai pode sugerir falência. O Dubai pode parecer distante, mas mostra bem o que pode acontecer a economias como a portuguesa.


O cenário é portanto dantesto e Portugal caminha para a falência, mas o que é que ouvimos os nossos partidos políticos defender? O CDS pede redução de impostos (que é uma medida muito bonita na teoria mas na prática significa mais dívida externa e é bom lembrar que Portugal todos os anos só em juros paga 5mil milhões de euros). O PCP e o Bloco de esquerda querem mais Estado, aumentos de salários, reformas aos 40 anos de trabalho. O PS lá continua a defender mais investimento público. Ninguém parece é estar preocupado com quem paga e como se paga.

No curto prazo (provavelmente mais cedo do que muita gente imagina) não vai haver outra hipótese, os impostos vão ter que ser aumentados porque o dinheiro não cai do céu, mas isso nenhum político português parece querer admitir...

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