quinta-feira, 1 de abril de 2010

Passos fatais


Tese consensual: os problemas do desemprego, do défice e da dívida resolvem-se com crescimento económico.
Estrutura da economia, vista do lado da procura: a um PIB igual a 100 correspondem 88 de consumo, 22 de investimento e -10 de exportações líquidas, ou seja, de diferença entre exportações e exportações; os 10 em excesso são dívida e a acumulação destas dívidas já excede os 100 da riqueza nacional anual. A pergunta: como é que se cresce?
O consumo só pode crescer de duas maneiras: ou com mais rendimentos ou com menos poupança. Mas já vimos que todos os nossos rendimentos vão baixar, pelo menos até ao final desta legislatura. E a poupança, que financia o investimento, não pode baixar por isso mesmo: reduzi-la seria o mesmo que aumentar a dívida externa. Enfim, se estavam a pensar em consumo para resolver o problema - esqueçam.
Se por cada 100 unidades produzidas consumimos 88, então poupamos 12. E se é com esta poupança que queremos financiar o investimento, o melhor é fechar a loja e emigrar para Marte. Mas não é. Nós sabemos que, àqueles 12 de poupança, juntamos mais 10 emprestados e elevamos o investimento para 22. Dúvida angustiante: e quem suporta esta dívida que não pára de crescer? Bom, o melhor é também não contarmos com o investimento.
Restam-nos as exportações. Que só podem crescer por duas vias: ou pelo aumento da procura externa ou pela redução dos custos internos. Formas de reduzir os custos: menos impostos do Estado, ganhos de eficiência das empresas, cortes nos salários dos trabalhadores. Querem fazer o favor de escolher? Lamento a conclusão implícita: o Governo foi realista nas projecções que fez - malgrado o fraco crescimento, não há espaço para crescer mais. É trágico mas é assim.
Lembrei-me de tudo isto no dia em que Pedro Passos Coelho foi escolhido para novo líder do PSD. O seu discurso é claro: o problema só existe porque existe este Governo, que é preciso remover. O que previsivelmente ocorrerá em breve, seja qual for a via a adoptar. O herói do momento está deslumbrado com o sucesso, revela uma imaturidade arrepiante e ignora as consequências do seu próprio delírio. Preparemo-nos então para o pior: os passos de Passos são passos fatais.
A crise agradece.
Fonte:Daniel Amaral no Diário Económico

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