quarta-feira, 28 de abril de 2010

Ataques de irresponsabilidade

"Este é um momento decisivo. O país tem que responder a este ataque dos mercados. É tempo de o Governo e os partidos, em especial o PSD, se entenderem quanto a isto: há que executar as medidas necessárias. Não é tempo para querelas inúteis", disse hoje Teixeira dos Santos.

Já era altura dos nossos políticos deixarem de brincar com o fogo com as suas constantes fugas para a frente e dramas de vitimização. Nas últimas semanas parece que tem vingado a tese de que Portugal está a ser alvo de um ataque de especuladores que nos querem comprar à Grécia. Portugal não é ainda a Grécia, mas quem ouve os membros do Governo português falar fica logo com a ideia de que isto é tudo uma grande cabala contra Portugal e que a culpa é dos especuladores. O que é extraordinário aqui é a inversão de responsabilidades. A culpa não é dos malandros dos especuladores que querem ganhar dinheiro à conta dos nossos disparates. A culpa é nossa, do país, que anda há anos a viver acima das suas possiblidades .... A culpa é do Estado (não interessa quem está à frente do Governo pois mudam-se as cores políticas e mantém-se sempre a tendência de aumento da despesa pública) que pesa hoje quase  50% do PIB nacional e tem um défice de 9.4%. Se fossem tudo rosas por Portugal e estivessesmos com as nossas contas públicas controladas os malandros das agências de rating não estariam a baixar o nosso rating nem estaríamos neste momento no lote dos países com maior risco de bancarrota.  Ninguém no seu perfeito juízo pode achar que seria normal que quem empreste dinheiro a Portugal neste momento tivesse o seu risco de nos emprestar dinheiro a ser remunerado à mesma taxa de juro que emprestaria à Alemanha. Vale a pena reler este ensaio que Ricardo Reis escreveu para o jornal i em Dezembro.

 Portugal nesta altura só tem uma solução. Devemos exigir aos nossos governantes que tranquilizem os credores e o mercado com medidas concretas de controlo das finanças públicas, mas olhando também para um crescimento económico sustentável. Em vez dos nossos governantes andarem a fazer-se de vitimas de ataques do mercado, deveriam estar a acalmar o mercado com medidas sérias e de preferência que fujam às típicas fórmulas do passado que nunca resultam. Aqui ficam algumas propostas para Sócrates (algumas delas já propostas antes neste blog):

1- Mexer nos impostos. Não aumentando os impostos, mas fazendo precisamente o contrário ou pelo menos tornando a política fiscal mais simples e transparente. Por exemplo como já proposto aqui: mexer com o IRS aplicando uma taxa de IRS única e positiva ou em alternativa pura e simplesmente abolir com o IRS taxando apenas o consumo via IVA (e aqui até se poderia eventualmente subir o IVA ligeiramente).

2- Baixar a despesa pública mas de forma significativa. Isto por muito que custe a muita gente, implica cortes salariais no sector público, e cortes na saúde e educação (em Portugal está-se convencido que injectar mais e mais dinheiro na educação por si só faz milagres. os resultados estão à vista). Acrescentaria a privatização da RTP que é um buraco financeiro sem sentido algum e que é sempre uma arma política a ser usada por quem quer que esteja à frente do Governo, e da TAP, e de empresas de transportes públicos como a Carris ou a Refer que andam à anos e anos a acumular prejuízos à conta de preços abaixo do mercado subsidiados pelo Estado.

3-Em suporte ao ponto 2 acabar com muitas das parcerias-público privadas pornográficas que o Governo Sócrates tem usado e abusado para mascarar as contas públicas.Ao passar responsabilidades que costumavam entrar no Orçamento de Estado para empresas públicas como a Estradas de Portugal, o Governo Português tem estado (de modo legal diga-se) a mascarar o verdadeiro défice público. À conta destes truques contabilísticos só nos últimos 2 anos as Estradas de Portugal viu o seu passivo aumentar uns pornográficos 1391%. Isto tem de acabar. 

4-Alterar a Constituição Portuguesa: Défices públicos deverão ser declarados como inconstitucionais. Portugal não pode continuar a viver acima das suas possibilidades, e sem crescimento económico sustentável. Em Portugal desdenhamos a poupança.Pior que isso, os nossos políticos estão convencidos que é o consumo que lidera o crescimento económico e não a poupança. Os nossos políticos desde o 25 de Abril que andam todos convencidos disto e ainda não conseguiram perceber, mesmo com todos os disparates que têm feito desde então, que esse caminho é o errado. O futuro de um Portugal sustentável só pode passar por um Portugal que seja rigoroso e que imponha a si própria a ambição de não ter défices, mas sim superavits. O futuro de Portugal só pode passar por um Portugal que tenha a ambição de estimular poupança, porque é a poupança que permite investimento futuro, que por sua vez permite ganhos de competitividade e aumento dos nossos níveis de vida. 

3 comentários:

  1. Miguel, concordo com quase tudo, menos com algumas das privatizações. Achas que alguém quer gerir a Carris ou a Metro Lisboa nas condições actuais? Se o quiserem, vão abolir muitas carreiras que servem pessoas que trabalham, porque não são rentáveis. Em suma: as pessoas precisam dos transportes públicos e é uma das poucas áreas onde o Estado deve ter posição importante. Uma cidade de futuro e uma sociedade moderna é aquela que abdica da parvoíce de ter constantemente de andar de carro. Eu vivo em Lisboa e não preciso de carro para NADA!
    Concordo especialmente com a medida da abolição do IRS. É o tal "think out of the box"!
    Abraço

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  2. João não concordo que seja função do Estado estar presente na área dos transportes públicos. Concordo contigo que os transportes prestados pelo metro ou pela Carris são importantes. Eu pessoalmente quando ando por Lisboa raramente uso carro (90% das vezes uso o metro). Alguns argumentos a meu ver que jogam a favor da privatização da Carris, da CP,etc:

    1- As empresas de transporte públicos são um buraco e cancro financeiro que vem do pós-25 de Abril. Nas nacionalizações do pós-25 de Abril os lucros das empresas públicas foram convertidos em "direitos adquiridos" para os trabalhadores e para o consumidor-eleitor. Muitas destas empresas de transportes públicos passaram a consumir o próprio capital em vez de o acumular para investimentos futuros. O que aconteceu foi que ao fim de alguns anos ficaram naturalmente sem capacidade para fazer novos investimentos ou
    para repor capital. Em especial a CP e a Carris
    são antros de regalias acima da média, ou como os sindicatos gostam de chamar "direitos adquiridos", são antros endividamento brutal e de infraestruturas velhas (neste ponto mais a CP do que a Carris que até tem vindo a renovar os seus aparelhos). De notar também que os prejuízos das empresas públicas têm peso no rating de Portugal, e quer gostemos ou não acabam sempre por ser pagos sobre a forma de mais endividamento da parte do Estado, ou seja, mais juros, que são sempre financiados por mais impostos.

    2-O sector dos transportes públicos em Portugal é um sector pouco competitivo, com empresas desvalorizadas, equipamentos obsoletos porque há falta de concorrência e porque a natureza das empresas de transporte públicos é a da típica atitude à "I don't give a shit", pois quer operem bem ou mal, os trabalhadores e os Gestores públicos de topo têm remunerações fixas e são sempre pagos de modo igual, quer a empresa dê prejuízos ou lucros(aliás nunca há lucros).Neste sector não há incentivos ao mérito.

    3-Empresas públicas não estão cotadas na bolsa, o que consequências nefastas:
    (a) a contabilidade e o valor da empresa são como gambuzinos, puros "seres imaginários";

    (b) não se podem financiar por dispersão de capital;

    (c)não há qualquer tipo de mecanismo que permita
    aos trabalhadores partilharem lucros;

    (d)mecanismos auditoria e controlo externo são baixos ou nulos;

    (e)são normalmente antros de Jobs for the boys do partido que está no Governo.

    4-O lema das empresas públicas é como já disse o de "I don't give a shit". Para a Carris, para a CP & companhia é-lhes literalmente igual terem mais utentes ou menos utentes.

    Respondendo à tua pergunta "Achas que alguém quer gerir a Carris ou a Metro de Lisboa nas actuais condições?" A minha resposta é: acho que sim. O sector dos transportes é um sector atractivo, em especial numa cidade com grande potencial turístico como Lisboa. Não tenho dúvidas de que se estas empresas fossem privatizadas (mas privatizadas como deve ser, e não privatizadas para grupos de amiguinhos criarem monopólios como aconteceu na era das privatizações dos tempos do Cavaquismo) e houvesse concorrência a sério neste sector, que toda a gente teria a ganhar:

    1- O Estado que deixava de ter os encargos brutais que tem com estas empresas.

    2-Os utentes que provavelmente passariam a ter empresas privadas a prestarem-lhe melhores serviços, e deixaríamos de ter que financiar este sector com os nossos impostos (impostos que poderiam passar a ser usados em coisas mais importantes e que devem ser função básica de um Estado de direito democrático como ter uma Justiça que funcione a sério ou Polícia que funcione como deve ser).

    3-Empresas privadas e mais concorrência a prestarem melhores serviços, e o Estado potencialmente a aumentar a sua receita fiscal.

    4-Com melhores serviços, potencialmente teríamos mais gente a deslocar-se para Lisboa de metro, comboio ou autocarro, em vez de carro.

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  3. P.S: Falei na Carris e de Lisboa mas o mesmo se aplica para outras empresas de transportes públicos no Porto e noutros centros urbanos.

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